2011-04-08

Da racionalidade

Nem sempre a emoção é a melhor conselheira. Rendo-me à eficiência da minha racionalidade e deixo que me abraces as emoções que lentamente vão sarando.

O ponto e o contraponto. Assim faz sentido.

2011-03-11

Intemporal

Ponto(s) de Vista

Existem gestos que desferem golpes mais profundos do que qualquer palavra arremessada. Acontecem actos mais mordazes e apocalípticos do que uma mera palavra pronunciada.

Em mim residem as palavras torrenciais, duras e a destilarem ódio. Em ti há o silêncio viperino dos actos, doentiamente mais agudos do que o meu vocabulário.

Lambo as feridas na aspereza do meu momento esventrado, dos sonhos roubados, dos projectos rasgados e do conforto arrombado. Não me peças docilidade quando a única cara que tenho é só esta: a da ira imensa que me consome, que me dita que me assassinaste, sem um tremor de comoção.

2011-03-09

"You are welcome to Elsenor"

Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício

Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição

Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsenor
E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita

Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar
Mário de Cesariny

Elos...


Cortesia: Nika


Somos elos
numa cadeia
sem noção de
como
sair dela.

2011-03-08

Vertigem

Tenho as palavras doridas de tanto silêncio, de tantos diálogos perfeitos aqui dentro da minha carcaça. Há um antes e um depois de ti, o que antevejo, a medo, ali no virar da esquina. Estou algures nos calcanhares do teu depois, sinto-lhe o cheiro da carne queimada, da minha pele em brasa e do meu coração desfeito.

Passou tanto tempo, mas as palavras aqui espelhadas enleiam-se no meu momento actual. Faz sentido voltar a mim e ao que sou. É o meu desejo, o meu único ensejo, agora.

2007-09-30

Regaço

Dir-se-ia que hoje preciso de um regaço quente e solidário... Dir-se-ia, hoje também, que preciso de um leite quente para a alma. Dir-se-ia tudo isto e um mundo, se houvesse a quem dizê-lo, a quem partilhá-lo...

Há uma insensatez grande no momento que me dá vontade de refugiar deste mundo, ocultar-me numa toca esquecida e ter a habilidade de me esquecer...

...

Os estados d'alma modificam-se... ainda balanço entre o querer-te bem e a indiferença...

"Adeus"

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
E eu acreditava!
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os teus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os teus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...
já não se passa absolutamente nada.

E, no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos nada que dar.
Dentro de ti
Não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.


Eugénio de Andrade

Passado

É passado o que me fizeste sentir. Deste-me esperança, fizeste-me acreditar que era possível ser feliz contigo, que abandonar o meu mundo para abraçar exclusivamente o teu era importante, porque nunca antes te dera isso e quis ser eu a fazê-lo, em abnegação total de quem sou, do que preciso e do que sinto. Mudei de mim e entrei num corpo novo ao qual tive que me adaptar. Deixaste de me dar a mão e senti o abandono.

Hoje, sem ti, nada tenho, nada sou. Dei tudo para perder tudo. Quero ir embora e nem sei como, se nem tenho para onde ir. Mergulho no trabalho que é teu e assumi como meu, que fiz crescer e que agora quero abandonar, porque estás em todo o lado e não suporto ver-te em todas as esquinas, em todos os centímetros.

Fora daqui não há segurança, terá que existir a honestidade de assumir a derrota perante todos, sentir novamente a compaixão, as dúvidas sobre o meu futuro e as eternas questões sobre as minhas decisões. Não sei como aguentá-lo, não consigo suportar isto, esta dificuldade de viver, esta densidade de sentimentos maus.

E parece que te vejo dizer que mais uma vez exagero, como se para ti todos os outros não passem de falhanços. Perdes-te no egoísmo, conta as pessoas que já passaram pela tua vida e reflecte. Talvez te assustes com a realidade.

# 1

Precisamos urgentemente de morrer, de nos exterminarmos, numa purgação de sentidos e sentimentos, para que possamos largar o passado numa prateleira e seguirmos em frente, firmes, na busca de novos sentidos para os passos na calçada irregular da vida.


O principal é entendermos o mal-estar, percebermos e darmos nome a essa sensação de incómodo que o tempo de encarrega de fazer crescer. Depois disso, de assistirmos ao desmoronar da crença, há que enterrar os olhos na linha do horizonte e seguir sempre em frente, sem medos, sem vacilações. Partir.


Falam do amor como se fosse o elixir eterno, a derradeira salvação, mas nada mais é do que uma angústia, uma dependência insana que nos come a alma, nos arranca o que é nosso e devolve o que não sabemos se queremos.


Fizeste-me perder a fé no amor. Que te baste enquanto praga saber que me destruíste. Parabéns. Mais uma vez provaste ser mais forte. Arrecado do campo de batalha uma mágoa imensa, uma ferida imposível de sarar. Desisto de acreditar. Fizeste-me igual a ti e odeio-te por isso.

2006-12-12

Fronteiras

Existem fronteiras que nunca deveriam ser ultrapassadas, as barreiras por onde espreitamos e conseguimos ver aquilo que nos está impossibilitado de alcançar. Estou nesse limbo, nessa terra de ninguém, onde não faz sentido nem mais um passo à frente, nem mais um passo atrás... No passado ainda morno jazem as palavras proferidas e os sentimentos contidos, os momentos profanados na brisa dos dias corridos. Aí, nesse espaço onde nada temos, porém tudo somos, esvaí-me de mim para não mais conseguir brotar em ti. Serão as lágrimas que me toldam os pensamentos, ou talvez o turbilhão do peito que me asfixia a alma... será tudo para no fim restar nada, espelho que reflecte o vácuo da minha vida.

Ausento os passos do trilho, embosco-me num sítio qualquer que não seja este onde por ora estou... criminosa fujo, depois da peleja perdida, e sento-me numa anónima pedra, na mais angustiante das solidões, para chorar a vida, berrar contra mim, que não mais me quero sentir. Evaporar-me pelos campos, rasgar-me pelos ramos das árvores, apodrecer por aí, no fundo de um riacho... Mas aí, nesse momento, ser livre, livre porque fiz sentido, fiz parte de algo que me acolheu no seu ventre e fui elemento presente, com a maior das dádivas: o não sentir.

2006-08-08

Futurologia

Em tempos fizémos do futuro uma quase promessa solene, um voto silencioso de que continuaríamos, em conjunto, mão na mão, pela estrada do nosso destino. Imaginei-nos já com as caras sulcadas pelo tempo, os cabelos mais brancos e os sentidos mais apurados numa simbiose perfeita: tu, eu, uma varanda com vista sobre um verde imenso , beijado pelo azul marinho, o silêncio, os cães, o comungar das paixões e dos prazeres das nossas vidas, contigo a pintar, comigo a escrever. Metades. Complementos de sentires, saboreares, filtrares que a vida nos fora ensinando. Imagino-nos sempre nesse futuro tranquilo e encantado, não tenho imagem que mais me aqueça a alma do que essa, porque é uma sensação quente e doce que me percorre quando fecho os olhos para sonhar com o nosso futuro.

Não imaginas o quanto quero viver esse sonho, o quanto tu és um sonho para mim... talvez tenha medo de, simplesmente, um dia acordar e ver que este sonho não era realidade. Tenho vislumbres desse dia, da manhã tenebrosa em que não te vou sentir enroscada em mim, e são tristes essas horas, esses dias em que não te sinto, em que nenhum gesto teu se funde com o meu, em que páras de pintar e eu páro de escrever e somos criaturas medonhamente reais, embrutecidas e carcomidas pela vida. Detesto esses momentos, a ti parece não te custar... aí chegam as diferenças, as experiências diferentes. Mas isso é o que pretendo que sejamos: diferentes. Amantes e cúmplices, felizes e sorridentes. Onde reside a dificuldade? Na essência? Na vivência? Na incapacidade?

2006-08-06

...

Antes dançávamos sem motivo, mesmo sem música, bastáva-nos a melodia quente e doce do nosso silêncio. Era tão bom sentir os nossos corpos embalados no mesmo ritmo, na mesma magia, na mesma sintonia...!

Hoje o silêncio impera, preenche todas as lacunas da casa, do espaço que nos rodeia. É um silêncio ruidoso e denso, um silêncio que já nenhum dos nossos gestos consegue cortar, onde já não embalamos em uníssono. Hoje já nem me tocas, não colocas a tu mão na minha e me levas pela tua galeria de perfumes únicos. Hoje estamos diferentes do que éramos... e eu tenho tantas saudades desse "nós" pretérito...

O que é feito do teu sorriso e do teu olhar que me desnudava a alma? Onde está? Preciso dele! Preciso de sentir o meu coração a acelarar, a respiração a ficar cortada, o arrepio que me lambia as costas... Onde estás, meu amor, onde estás que já nem me procuras?

Fui eu que errei? Busco todas as culpas, mas já nem tenho mais espaço dentro de mim para a repulsa que tenho de mim própria... Saberás tu o que é sentir isto?... Não creio...

Dói tudo cá dentro quando sinto que, cada vez mais, estou no fim do rol interminável que é a tua lista de afazeres, porque é isso que eu sou: mais um intem a cumprir... depois de tudo... depois de todos...

2006-08-04

Começo...

Agora venho para aqui... para este novo cantinho onde me posso dar à liberdade de ser uma pessoa sem rosto, ter uma capa de anonimato tranquilizadora, um espaço onde tenho a liberdade de ser simplesmente eu.

Já vou no terceiro ou quarto blog, perco-lhes a conta, porque com o passar do tempo são sítios que vão perdendo o seu sentido próprio, como se eu amadurecesse (ou endurecesse) e deixasse de me enquadrar naquela casa que construí.

Sim... agora venho para aqui buscando esse renascer, essa essência que nem sequer sei onde anda.

Venho para aqui de mágoa em riste, triste e cansada, desanimada e perdida. Sou um "psiu" sem eco, um "estou aqui" sem resposta, alguém que precisa de se sentir amada e por vezes não consegue. Aqui fujo aos escolhos da existência, às farpas da vivência, à rotina dormente que me está a matar, que nos está a matar...

Aqui estraste tu... dentro deste meu eu estranho, entranhaste-te na minha alma e é o teu perfume que está em todo o lado. És tu que aqui estás, deixou de existir o meu eu... e isso dói... Amo-te em excesso e perdi-me.